Há cerca de uma hora e meia, estava a sair de uma discoteca e apanhei um taxi. Como de costume o taxista abordou-me sobre a noite, se me tinha divertido ou não e fez-me muitas perguntas sobre a discoteca:
"Mas aquilo estava cheio, não estava?
"Népia, nem por isso. Para o que costuma... mas porquê?"
"Aí há umas horas passei aí e estava cheiíssimo. Mas vi muita miudagem a sair de lá. Uns que vieram aqui comigo, contaram-me que estava dificil para entrar, que já tinham sido expulsos de mais dois ou três sitios porque a semana passada saiu uma reportagem sobre esta discoteca e o facto de o sitio permitir a entrada de miudos com menos de 16 anos." Sim, eu sei. Eu próprio comecei a ir lá com 14 anos. Mas pergunto-lhe, o senhor é contra isso?"
"Claro que sou. Ás vezes apanho miudos com 12, 13 anos aqui em santos á noite e eles vão num estado que ultrapassa o lastimoso. Se um dia a policia lá vai, provavelmente haverão muitos establecimentos a encerrar"
"Eu discordo. - disse logo. Já assisti a rusgas dentro daquele sitio especifico, e nunca foi, como podemos ver, fechado. Aliás até ser percebe. Suponhamos que o senhor, agora e até ali á frente, decide andar a mais 10 Km por hora do que lhe é permitido. Está no fundo a infringir uma lei, do limite de velocidade. Ou se um rapaz estiver na rua e se entusiasmar demasiado com uma rapariga com quem esteja, também pode estar a infringir a lei do pudor. E alguém lhe diria alguma coisa? Em alguma destas situações? Não!"
"Mas devia - Replicou o taxista. Têm a obrigação disso. As leis existem, e existem para cumprir. Se eu ultrapassar o limitide de velocidade, ponho em causa a minha segurança e a dos outros. Tal como deixarem entrar um miudo de 11 anos numa discoteca ou num clube ele sabe que não devia estar lá, e as pessoas que o vêm bastante bebado e lhe continuam a vender bebidas para assegurar o lucro da casa. A saúde do rapaz está a ser posta seriamente em causa. As leis não são feitas ao acaso, têm uma razão de ser e devem ser estrictamente cumpridas."
Foi nesta altura que me pus a pensar numa série de coisas. Lembrei-me de alguns dos colaboradores deste blog. E então disse:
"Acho que sou obrigado a discordar do senhor. Eu tenho um conjunto de amigos meus que se têm esforçado bastante, por legalizar as drogas leves e o IVG. Assim como a prostituição. E para dizer a verdade, o assunto não é assim tão ridiculo ou boémio como poder parecer á primeira vista.
O aborto é legal. Quase. Por mais que a lei o impeça ele ocorre. Centenas de raparigas desesperadas procuram-no, nos cantos mais reconcitos dos suburbios de Lisboa. Conheci mesmo uma rapariga assim: 17 anos, sem possibilidade de ter um filho, foi até á Amadora para poder ter um aborto. Uma clinica tão suja que eu nem arriscava utilizar a sua casa de banho. Mas foi e fê-lo. Teve alguns problemas de saúde, mas ao fim de algum tempo e felizmente, ficou a 100%. E este tipo de negócios pouco escropulosos que visam lucro fácil existe por causa do aborto. Que existe independentemente da lei.
Tal como nas discotecas, onde a discoteca que deixar entrar miudos a partir dos 14 anos, contra a lei, apanha toda a facha etária entre os 14 e os 16 anos. Ganha mais de mil clientes habituais, se tivermos em conta que é provavelmente a unica da cidade que faz isso. Portanto nem sequer tem de disputar estes clientes. E assim aumenta o seu lucro em bastante...
Por fim, a questão das drogas leves. E sejamos realistas, tá a ver aquele canto ali, ou aquela esquina do fundo? - e apontei - Vê algum policia? Não! Algum agente que sirva o estado? Não! E se eu quiser tomar alguma droga naqueles sitios, quem me impede? Ou a vender... ? Responda-me então, as drogas leves são ilegais em Portugal? O facto de, ao contrário da Holanda, o estado não ter qualquer responsabilidade na sua venda, aumenta os preços no trafego ilegal, a clandestinidade em que isto se passa e a aumenta a proximidade ás drogas pesadas. E é, humanamente impossível, contratar o suficiente numero de forças e instituos que possam controlar todos os establecimentos, todas as ruas, todos os cantos... Diga-me, já conheceu, honestamente, alguém que deixa-se de tomar drogas leves por ser ilegal? "
"Bem, agora apresenta-me algumas questões mais complicadas. Acho que o aborto é o ponto mais importante, porque de facto sem condições de saúde vão continuar a haver muitos problemas para a sociedade. Também a prostituição que referiu á pouco é um ponto preocupante. Há uns anos, alguém que quisesse frequentar as prostitutas não apanhava doenças, e mesmo assim a policia andava muito mais em cima (...) Agora é muito mais fácil para elas fazerem o que quiserem, andam aí... impedi-las de o fazer é impossível, a actividade existe em todo o Mundo, até dizem que é a mais antiga profissão... mas noutros países é exercida com mais respeito, e com controlo do ministério da saúde. São sujeitas a realizar um exame médico de X em X tempo, caso contrário não podem exercer. Isto torna a actividade mais saudável, evita a propagação das DST's, e até a torna mais respeitável, sendo que impede o proxenetismo etc. "
"Sim, legalizar trata-se disso. Não é permitir que as coisas sejam feitas, porque elas já são feitas! É permitir que sejam feitas com supervisionamento, com ordem, com condições e respeito. Quem é cego para continuar a impedi-las, para não reconhecer o que existe á frente dos nossos olhos, mostra-se demasiado irresponsável para poder dar uma palavra.
As coisas não podem ser impedidas. Como o fazer? Enchemos as esquinas de policias á procura de prostitutas (mesmo quando todos sabemos onde elas estão) e prendemo-las? Ou as clinicas, procurando onde o aborto é feito clandestinamente. Ou os becos, para poder encarcerar aqueles que tomam, calmamente e sem incomodar os outros, as suas drogas leves. Ou ainda as dicsotecas... No fundo todos nós pisámos o risko da lei algumas vezes. É pisado devido á sua própria existencia. Evitar isso obriga o estado a dispôr de uma força que não tem, e que se for criada, o torna num regime muito menos flexível, mais rigido, mais dictatorial. Sermos democratas e liberais, obriga-nos a aceitar algumas condições na sociedade mais repreensíveis. Obriga-nos a aceitar que nem sempre as leis que podemos criar, têm alguma utilidade prática. Só o tempo que leva entre uma inspecção policial encontrar meninos mais novos num bar, e o encerramento do mesmo, por entre várias burocracias, e truques judiciais (no nosso veloz sistema tuga) era o suficiente para a barwoman mais jovem morrer, e o DJ ficar maneta. Talvez seja mais fácil, simplesmente aceitar, ou alterar a lei. Ou criar uma discoteca só para gente naquela facha etária onde o alcool fosse mais moderado, e que evitasse chatisses.
Que se trafique nos cantos, que se prostitua nas esquinas, que se aborte nos becos! Democrata como sou, defendo qualquer hipótese acima da ditadura... Já agora, arranjava-me aqui 25 cent d troco?"
"Com certesa meu jovem. Prazer em falar consigo. Boa noite e bom fim de semana"
"Igualmente, e obrigado"
Cada vez conheço mais taxistas...
Friday, October 13, 2006
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4 comments:
Referes portanto, e muito muito resumidamente, que pela fragilidade do cumprimento das leis, pelo obstáculo que elas apresentam e pelo "chato" que é cumpri-las, mais vale viver em anarquia e cada um sabe de si?
Foi isso que, leigamente, entendi. Gostava de ser esclarecido.
Referes portanto, e muito muito resumidamente, que pela fragilidade do cumprimento das leis, pelo obstáculo que elas apresentam e pelo "chato" que é cumpri-las, mais vale viver em anarquia e cada um sabe de si?
Foi isso que, leigamente, entendi. Gostava de ser esclarecido.
Pelo que percebi achas que pelo obstáculo que as leis apresentam, pela burocracia, pelo incumprimento e pela "chatice" que a Lei é devemos saudar a anarquia.
Foi isto que, leigamente, entendi.
Esclarece-me, por favor.
Flecha Ruiz, Anarquia significa a inexistencia de um estado vigente que, em social-democracia, deve auxiliar os cidadãos fornecendo estruturas que possam satisfazer algumas das suas prioridades(escolas, universidades, hospitais...). E como sabemos, isso seria um enorme prejuízo para o nosso Portugal, neste momento.
Defendo antes que a lei não se intrometa no que não pode, porque não pode e porque não faz sentido que o faça. Mostrei no meu post, resumidamente, algumas situações de infracções á lei que, não só não podem ser evitadas, como não faz sentido que exista. Se eu abortar em minha casa, e o meu vizinho do lado, contra o aborto, não souber, não prejudiquei ninguém com o meu aborto, a não ser eu próprio.
As leis não controlam a nossa acção a 100% como referi, mas controlam a do aparelho estatal. E era muito mais fácil que este auxilia-se quem precisa. Nomeadamente a abortar
Espero que te tenha esclarecido=)
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